Estado Babá

quinta-feira, 20 de outubro de 2011


O ESTADO BABÁ

“Este é um livro perigoso, principalmente porque se cair nas mãos de legisladores ou Câmaras de Vereadores das cidades, eles encontrarão novas ideias do que proibir ou obrigar. Mas, para as pessoas sensíveis, é um despertar para os esforços de pessoas intrometidas de esquerda e de direita que esquadrinham cada aspecto das nossas vidas, do que comemos e bebemos até o que assistimos na televisão ou aos jogos que nossos filhos jogam”.
 David Boaz, vice-presidente executivo do Cato Institute e autor de Libertarianism: A Primer[1]
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A intervenção estatal abordada na introdução do livro “Estado Babá”, em muitos pontos nos assinala preocupação pertinente de como o governo tem sido hostil ao adentrar no espaço privado, ditando regras absurdas que, muitas vezes são inaplicáveis e de interesse econômico político mascarados.

Ainda que o exercício do estado no que refere aos benefícios à população, de forma intrínseca vise seu benefício, nem todas as novas leis e projetos de apreensão do governo são ruins para o todo. Tais como, advertência aos prejuízos à saúde dos fumantes, ruas limpas, em Chicago por exemplo, a exigência de que: “...cavalos que puxavam carruagens usassem fraldas...”.

Em todo o país norte americano, as preocupações giram em torno de assuntos como: a saúde do povo no que tange à alimentação, o plano de entrega de farmácia em domicílio, prevenindo e acelerando a contenção de determinadas enfermidades, e mais uma vez, quanto ao cigarro, em cidades californianas, a proibição de fumar em áreas externas, tem cunho positivo, logo, “...visam um mundo sem fumantes, sem gordura...”, o consumo do álcool de modo suavizado e sem concupiscência. Todavia, será que todos concordam com isso?

Essa severa “preocupação” patriarcal do governo, abordada no texto – quase que familiar - não é novidade, e tal processo, transfere quase toda a responsabilidade social para um ente que consideramos o causador de todos os problemas e, também, a solução deles: o Estado. Mas há de se questionar até onde tal intervenção é benéfica, bem como, se a mesma não teria criado uma relação de dependência à população.


A parte negativa desta história traz como exemplos as leis criadas em Nova York, que invadem o espaço privado de maneira extrema: “...a proibição de cigarros com gosto de bala...”, “...banners de propaganda com cheiro...” dentre outras como a: “...Regulagem da quantidade de água das tigelas dos cachorros, imposição que os proprietários desses animais implantassem microchips sob a pele canina...”. E somente agora a população, de forma tímida, começa se questionar: quando foi que perdemos o “Livre Arbítrio”? Seriam necessárias tantas exigências?

Positivista e não raras às vezes, extremista, Kelsen, é venturoso ao dizer que: é função da ordem social motivar certa conduta recíproca dos seres humanos, estes deveriam conter certos atos que, por ventura, fossem nocivos a sociedade. De igual forma, deveria aquela também incentivar o que é considerado útil à sociedade.

Logo, o que refere adequação social – assiduamente utilizada como ferramenta de argumentação jurisprudencial para julgar aquilo que não mais fere o todo - dos problemas presentes, deveria ser de competência de cada indivíduo, inclinados ao bem social, e não apenas governamental.

O governo é invasivo, entretanto não é uma organização ditatorial onde as regras são impostas e devemos ficar calados, muito pelo contrário, é nosso o poder de votação para eleger esses representantes, e, do mesmo modo, exigir-lhes o que fora outrora prometido.

É de conhecimento geral que a omissão é sinônimo de aceitação; até quando? E quando o único veículo de comunicação, a mídia, é de controle do governo, como garantir a veracidade do noticiado e enfatizado?!

No intuito de encobrir as preocupações dos americanos quanto aos abusos dos legisladores, em 1996 o Presidente Bill Clinton, em seu discurso anual, refere que “... a era do grande governo teria terminado...”. Na verdade, esta jogada ardilosa da presidência americana, apenas havia mudado seu foco, eles entrariam com maior força no espaço privado e dessa forma confundindo a todos sobre o que é espaço público e o que é privado[2]. 

O termo que enseja a preocupação de um “Estado Babá” – Nanny State - não é uma observação atual, como traz o texto, há informações que fora Iain Macleod, em 1965, que referiu este em sua obra “o que gosto de chamar de estado babá”. Não se trata tão logo de um problema do pós-modernismo e ao léu, mas sim de uma preocupação bem enraizada que afeta não apenas os EUA, mas o Brasil e demais países que seguem tal febre.                 

Para conseguir o sucesso, o Estado Babá por intermédio dos meios de comunicação social, traz uma excessiva carga de material todos os dias - mídia de alienação -, como: violência, emocionantes casos que envolvam morte, doenças e catástrofes naturais. Assim, faz do indivíduo bem como de sua família, hipossuficientes perante a grandiosidade do que são expostos e, também, encobertos por esse manto de noticias, deixam de aventar assuntos importantes tais como educação (lei – direitos e deveres), projetos de prevenção à criminalidade, política e etc.

Nesta senda, os indivíduos “comuns”, inebriados, agarram-se a fé e ao “consumismo”, de modo a esquecer seus incontentamentos públicos trazendo-os para o espaço privado. Argumentando com amigos e familiares, mas sem se aprofundar muito, não criando soluções.

As colocações do Estado Babá, poderiam muito bem nos fazer recordar do célebre romance escrito em 1949, "Nineteen Eighty-Four ou 1984 - Eric Arthur Blair; pseudônimo George Orwell", que projeta um futuro onde tudo poderia ser controlável pelo Big Brother, através de seus ministérios. Inclusive, o pensamento, intitulado Ministério do Pensamento. Ademais, traz a obra, o lema desse futuro fictício como sendo: “Guerra é paz, Liberdade é escravidão, Ignorância é força”.

Assim como aconteceu na Idade Média, onde apenas os Padres sabiam ler ou tinham acesso à arte da escrita, ditavam os ensinamentos divinos manipulando-os para que tivesse peso de “lei” perante os fieis, hoje, o Código Fiscal americano, tal como a nossa Constituição Federal brasileira, não é diferente, pois se faz ininteligível ao ser humano comum.

Restringir a população ao acesso de seus direitos inerentes por manter uma linguagem desatualizada e arcaica, é descaracterizá-lo, fazê-lo perder autonomia e parece-nos que é exatamente o que os governantes apreciam; além de que, os poucos que recorrem à justiça atualmente, ainda, muitas vezes o fazem sem necessidade ou sem merecimento e os manifestos já não tem o peso de alguns anos atrás.

Ironicamente, em reflexão através do livro, faço a conexão com um dos princípios do nosso sistema legal em que: “ninguém pode se eximir de cumprir a lei alegando o seu desconhecimento”. Historicamente – segue complemento a baixo – houve eficácia, afinal, não era do domínio de “todos” o acesso a informação, assim, facilmente foram conduzidos pelo Estado patriarcal – Estado Babá -, mas nos dias de hoje, faz-se necessário manter a escrita dificultosa e antiquada?

“(...)Tal preceito foi herdado do direito romano ignorantia legis neminem excusat e a sua razão é a exclusão da possibilidade de que alguém, ao cometer qualquer ilícito, civil ou criminal, possa invocar em sua defesa o desconhecimento da existência de lei que o proíba, o que, em verdade, seria letal à estabilidade do grupo social(...)”[3]

Por fim, chegamos à beira do absurdo total, e ressalto não ser ainda o "absurdo total", pois artigos, livros e comentaristas questionadores destas insanidades citadas, problematizam e trazem as questões para o conhecimento geral, mesmo que muitas vezes o acesso, ou melhor, o interesse, seja de um pequeno grupo restrito de curiosos ‘politizados’. Também, é difícil definir as leis  e os projetos babás, mas acredito que um bom exemplo seja a “lei da palmada” e o projeto  no combate a Dengue em não liberar o larvicida para o efetivo extermínio do foco, no Brasil.[4]

Contra um "Estado babá", que ameaça cada vez mais a liberdade individual, por intermédio da Globo – Economia, em 6 de março de 2011, David Harsany,  que lançava seu livro no Brasil,  criticou o paternalismo e intervencionismo; dizendo em entrevista ao G1: “Não sou expert em Brasil, mas penso que muitas pessoas devem ter as mesmas preocupações nesses temas. É um país próspero, e tenho certeza de que cidadãos brasileiros também lidam com várias tensões entre liberdade individual e organizações coletivas.”[5]

O absurdo total dar-se-à no dia em que todos se calarem e sucumbirmos às ordens do estado “pai de todos”, do Big Brother (ibidem G.O. - 1949). Quando comentaristas como Arnaldo Jabor forem aniquilados, e para fechar tal resenha crítica, trago um trecho do Escritor Russo Maiakovski:

“Tu sabes, conheces melhor do que eu a velha história. Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim. E não dizemos nada. Na Segunda noite, já não se escondem: pisam as flores, matam nosso cão, e não dizemos nada. Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz, e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada.”


REFERÊNCIAS


·         Material de aula; SOCIOLOGIA JURÍDICA 3 - ESADE.





·         BLAIR, ERIC ARTHUR; Nineteen Eighty-Four; George Orwell; edt. GALLIMARD; 1949.
·         DAMATTA, ROBERTO AUGUSTO; A casa e a rua: espaço, cidadania, mulher e morte no Brasil; edt. ROCCO; 1984.



[1] http://www.livrarialitteris.com.br/default.asp?produto/499
[2] Maior conhecimento pode ser extraído - “A casa e a rua: espaço, cidadania, mulher e morte no Brasil - 1984 - Roberto Augusto DaMatta.”
[3]  http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:Zue9j82VgpgJ:www.ljsantos.com.br/artigos_34.php+ninguem+podera+eximir-se&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br&client=firefox-a
[4] http://cbn.globoradio.globo.com/materia.php?id=603871&area=CBPRJ
[5] http://www.luciamotta.com/2011/03/contra-um-baba-que-ameaca-cada-vez-mais.html

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